A Fada Oriana
O Peixe
Cá fora a tarde estava maravilhosa e fresca. A brisa dançava com as
ervas dos campos. Ouviam-se pássaros a cantar. O ar parecia cheio de
poeira de oiro.
Oriana foi pela floresta fora, correndo,
dançando e voando, até chegar ao pé do rio. Era um rio pequenino e
transparente, quase um regato; nas suas margens cresciam trevos,
papoilas e margaridas. Oriana sentou-se entre as ervas e as flores a ver
correr a água. De repente ouviu uma voz que a chamava:
- Oriana, Oriana.
A fada voltou-se e viu um peixe a saltar na areia.
- Salva-me, Oriana - gritava o peixe.
- Dei um salto atrás de uma mosca e caí fora do rio.
Oriana agarrou no peixe e tornou a pô-lo na água.
- Obrigado, muito obrigado - disse o peixe, fazendo muitas mesuras.
-
Salvaste-me a vida e a vida de um peixe é uma vida deliciosa. Muito
obrigado, Oriana. Se precisares de alguma coisa de mim lembra-te que eu
estou sempre às tuas ordens.
- Obrigada - disse Oriana - agora não preciso de nada.
-
Mas lembra-te da minha promessa. Nunca esquecerei que te devo a vida.
Pede-me tudo o que quiseres. Sem ti eu morreria miseravelmente asfixiado
entre os trevos e as margaridas.
A minha gratidão é eterna.
- Obrigada- disse a fada.
- Boa tarde, Oriana. Agora tenho de ir embora, mas quando quiseres vem ao rio e chama por mim.
E com muitas mesuras o peixe despediu-se da fada.
Oriana ficou a olhar para o peixe, muito divertida porque era um peixe muito pequenino, mas com um ar muito importante.
E
quando assim estava a olhar para o peixe viu a sua cara reflectida na
água. O reflexo subiu do do fundo do regato e veio ao seu encontro com
um sorriso na boca encarnada. E Oriana viu os seus olhos azuis como
safiras, os seus cabelos loiros como as searas, a sua pele branca como
lírios e as suas asas cor do ar, claras e brilhantes.
- Mas
que bonita que eu sou - disse ela. Sou linda. Nunca tinha pensado nisto.
Nunca me tinha lembrado de me ver! Que grandes são os meus olhos, que
fino que é o meu nariz, que doirados que são os meus cabelos! Os meus
olhos brilham como estrelas azuis, o meu pescoço é alto e fino como uma
torre. Que esquisita que a vida é! Se não fosse este peixe que saltou
para fora da água para apanhar a mosca eu nunca me teria visto. As
árvores, os animais e as flores viam-me e sabiam como sou bonita. Só eu é
que nunca me via!
Sophia de Mello Breyner Andresen, A Fada Oriana
"A leitura é para o espírito o que a ginástica é para o corpo." Steele